O que é longe e o que é perto depende de cada um. Como as crianças criam essa noção?
por Rikardo Santana da Silva
O que você entende como longe ou perto? As percepções de perto ou longe variam de pessoa para pessoa. Por que temos essa diferença entre nós? O que nos faz pensar que algum lugar é longe ou perto? Seria essa uma construção feita pelos professores no nosso ensino fundamental? Além da noção de perto ou longe, também existe a questão da representação disso. Como construímos a imagem do nosso espaço?
Uma boa opção para avaliar isso é pelos desenhos que as crianças na faixa etária dos 7 a 11 anos fazem, para tentar identificar como eles representam seu espaço. Foi isso que a pesquisadora Michele Pereira decidiu fazer em sua dissertação de mestrado em Geografia na Universidade Federal do Paraná (UFPR): “Do próximo ao distante: A construção do conceito de espaço geográfico em crianças do ensino fundamental”. O estudo quis mostrar como essas crianças compreendiam seu espaço geográfico.
O estudo, feito com 20 alunos de 1ª a 4ª séries de uma escola municipal de Curitiba, mostrou que a perda de noção de espaço faz com que as crianças tenham dificuldade para localizar-se. Essa falta de noção, segundo a autora, é provocada pela pouca atenção dada à geografia. “O foco no ensino fundamental é ler e escrever e fazer equações. A geografia não é vista como algo importante, e muitos professores não têm formação nessa área. Se tivéssemos professores com formação específica nessa área, teríamos resultados diferentes. Até há cursos de alfabetização cartográfica na rede, só que não podem oferecer o aprofundamento teórico e empírico que temos na graduação”, afirma Michele.
A dissertação trabalhou com o conceito de espaço e lugar. “Tudo é espaço. A partir do momento em que eu me identifico com determinado espaço, em que eu me localizo nesse espaço e me sinto pertencendo a ele, esse espaço se transforma num lugar. O lugar é um espaço familiar”, explica. A partir dessa análise, a autora identificou que as crianças não tinham uma identificação com os espaços da própria cidade, pois não a conheciam. “Se a criança tivesse contato com esse lugar, andasse pelo bairro ou pela cidade, melhoraria a questão espacial. A pesquisa mostrou que, as crianças não demonstraram identificação nenhuma com a cidade de Curitiba”, confirma.
Os resultados mostraram que o quesito de perto ou longe acaba sendo criado pela subjetividade. “Uma das respostas encontradas para o que a criança achava longe foi a Inglaterra. Depois fui descobrir que a mãe da criança morava naquele país, estava longe dela, e por isso para ela a Inglaterra era longe, mesmo sem saber a distância”, conta Michele, que completa “Apesar de eu ter percebido que algumas crianças têm dificuldade em se localizar, minha pesquisa estava preocupada mais com a representação gráfica de espaços hierárquicos, que iam desde a sala de aula até o planeta”, explica.
A não identificação com o espaço e a dificuldade em se localizar e representar espaços são alguns dos problemas apontados pela autora. Para melhorar essa condição, ela aponta que é preciso mudar o modo como se pensa educação hoje. “É preciso valorizar disciplinas que não sejam Matemática e Português. Temos que dar mais importância para a Geografia e a questão do espaço. Além disso, precisamos ter menos alunos nas salas de aula e professores formados em Geografia nas escolas, com um ‘espaço’ menor entre o ensino fundamental e o universitário e, sobretudo, não queimar etapas, ensinando o que as crianças não estão prontas para aprender”, conclui Michele.
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